quinta-feira, 26 de novembro de 2009

-> A fome e o amor(augusto dos anjos)
Fome! E, na ânsia voraz que, ávida, aumenta,
Receando outras mandíbulas a esbangem,
Os dentes antropófagos que rangem,A
ntes da refeição sanguinolenta!

Amor! E a satiríase sedenta,
Rugindo, enquanto as almas se confrangem,
Todas as danações sexuais que abrangem
A apolínica besta famulenta!

Ambos assim, tragando a ambiência vasta,
No desembestamento que os arrasta,
Superexcitadíssimos. os dois

Representam. no ardor dos seus assomos
A alegoria do que outrora fomos
E a imagem bronca do que inda hoje sois!

fonte: http://www.biblio.com.br/

O Augusto dos Anjos sempre me atraiu pela morbidade de suas obras. Em alguns trechos chega a falar de morte, ossos e funerais. Minha identificação máxima com ele se dá no meu poema "A sós". Naquele momento eu me sentia como se estivesse conversando com o demônio e tendo sua aura asquerosa a penetrar pela minha miserável alma contigente.
Por outro lado, sempre gostei da estética barroca. Os detalhes, a arquitetura, os enfeites, sempre foram , para mim, mais agradáveis que o próprio sentimento subjetivo do romantismo.
Embora me parecendo poetas totalmente opostos, um poeta barroco e um poeta romântico, eu encontrei neles um elemento em comum: a pornografia


->Uma graciosa mulata filha de outra chamada Maricota, com quem o poeta tinha se divertido, e chamava ao filho do poeta seu marido:(Gregório de Mattos)

1
Por vida do meu Gonçalo
Custódia, formosa e linda,
que eu não vi mulata ainda,
que me desse tanto abalo:
quando vos vejo, e vos falo,
tenho um pesar grande, e vasto
Do impedimento, que arrasto,
porque pelos meus gostilhos
fora eu pai dos vossos filhos
antes que vosso padastro

2
O diabo sujo e tosco
me tentou como idiota
a pecar com Maricota,
para não pecar convosco:
mas eu sou homem tão osco,
que a ter notícia por fama,
que lhe mamaste a mama,
e eu tinha tão linda nora,
então minha sogra, fora,
e não fora minha dama

3
Estou para me enforcar,
Custódia, desesperado,
e o não tenho executado,
porque isso é morrer no ar:
quem tanto vos chega amar,
que quer por mais estranheza
obrar a maior fineza
de morrer, porque a confirme,
morra-se na terra firme,
se quer morrer com firmeza

4
Já estou disposto d'agora
a meter-vos num batel
e dar convosco em Argel
por casar com minha nora:
Não vos espante, Senhora,
que me vença tal furor,
que eu sei, que em todo o rigor
o mesmo será, e mais é
ir ser cativo em Salé,
que ser cativo do amor

fonte: Gregório de Mattos - Antologia Poética

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

A árvore da serra

A conversa se estende por tempos
onde,fugaz, não percebo a passagem
Meus desejos, encontro, não nego.
Mas à cada palavra, escondo, não peço

Subitamente, a noite, aflora-me sua chegada
e meus pêlos em pé apenas estado de dentro
manifestam, sem ter onde se esconder

E quando menos espero - e mais quero-
encontro-te por cima de mim
das vestes serenas me despido,
da corriqueira aparência me despeço

fluo pela cama com toda promiscuidade
Criativa, ambígua, crescida, diminuída
Esfolada, arcada, cansada, fodida




Você passa dias caozando aquela gata e fica com a impressão de que ela é uma santa.

A ÁRVORE DA SERRA

- As árvores, meu filho, não têm alma!
esta árvore me serve de empecilho…
É preciso cortá-la, pois, meu filho,
Para que eu tenha uma velhice calma!
- Meu pai, por que sua ira não se acalma?!
Não vê que em tudo existe o mesmo brilho?!
Deus pôs almas nos cedros… no junquilho…
Esta árvore, meu pai, possui minha alma!…
- Disse – e ajoelhou-se, numa rogativa:
“Não mate a árvore, pai, para que eu viva!”
E quando a árvore, olhando a pátria serra,
Caiu aos golpes do machado bronco,
O moço triste se abraçou com o tronco
E nunca mais se levantou da terra!


Ai, ai, chega o fim de semana!!!!

Ao conde de Ericeira D. Luiz de Menezes, pedindo louvores ao poeta, não lhe achando ele préstimo algum

Um soneto começo em vosso gabo;
Contemos esta regra por primeira,
Já lá vão duas, e esta é a terceira,
Já este quartetinho está no cabo.

Na quinta torce agora a porca o rabo:
A sexta vá também desta maneira,
Na sétima entro já com grã canseira,
E saio dos quartetos muito brabo

Agora nos tercetos que direi?
Direi, que vós, Senhor, a mim me honrais,
Gabando-vos a vós , e eu fico um Rei

Nesta vida um soneto já ditei,
Se desta agora escapo, nunca mais;
Louvado seja Deus que o acabei.

Gregório de Mattos

domingo, 22 de novembro de 2009

Narrativa

Em torno de paredes informes meu vazio se exaspera
Como se preencher-se fosse dos vícios a virtude
Ser preenchido por sua forma, inconvenientemente espera.
A barriga agora relaxada apenas sente o presságio da forma
Deseja-o incessamente, se abre, se fecha, se não abre, não fecha

Pouco à pouco o vazio vai tomando forma, o branco se torna colorido
e tudo aquilo que antes só existia fora de mim, passa a ser eu mesma,
como se odiasse minha própria compleição, a reprimo.

Reprimo, mas desejo, dependo, espero...

Descrever sua forma não sei ao certo, apenas permito
que com fúria exaure minha informe ausência e,
por frágil que sou (admito), me esculpa em sua forma

Ativa. Agora já totalmente passiva, sou apenas esboço de tua obra.
Tomo forma. Preencho-me lascivamente, delicadamente surto
Barriga contraída. Me dou conta de que a forma sou eu, é você.
Recebo o toque final e me desenformo. Vazia que estou, vazia que sou, gozo.


Amigos, quem interpretar essa poesia com seu correto significado, ganha uma poesia minha especialmente dedicada.

abraços